Implementação do discipline agile e educação 3.0 em projetos educacionais sustentáveis
20 de abril de 2023
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DOI: 10.22167/2675-6528-20230008
E&S 2023, 4: e20230008
Rútilo Pinheiro de Melo Neto; Maria Paula Novakoski Perides
As grandes mudanças pelas quais o mundo está passando, desde o início da Era da Inovação em 1980, têm colocado em xeque os modelos de ensino tradicionais. A rapidez com que estas mudanças acontecem torna o conteúdo rapidamente obsoleto e, cada vez mais, os profissionais serão valorizados pelas habilidades, como: autonomia, criatividade, atitude, capacidade de atuar sob pressão e resolução de problemas. Nesse contexto, a escola precisa ter como foco desenvolver estas competências. A aprendizagem baseada na educação 3.0 é um método de ensino que promove o desenvolvimento de competências e habilidades por meio de novas práticas pedagógicas digitais para a elaboração de atividades bem planejadas e estruturadas[1].
O processo educativo desta metodologia se fundamenta em soluções vinculando o conteúdo, presencial ou virtual, com as ferramentas tecnológicas para dinamizar a construção do conhecimento, de forma mais significativa e assertiva. A ciência, tecnologia e inovação proporcionam um desenvolvimento científico educacional de qualidade para todos os envolvidos. Trata-se, portanto, de uma metodologia ativa que proporciona a autonomia e protagonismo do estudante, estimulando o autoaprendizado e pensamento crítico com o uso de novas tecnologias para promover a inovação na educação[2].
Ainda neste pensamento (“mindset”) ativo, o “Disciplined Agile” (DA) também é uma abordagem que busca usar as melhores práticas e ferramentas de gerenciamento de projetos para produzir um produto que agregue valor aos clientes. Para tanto, deve ser definido um “Way of Working” (WoW), ou seja, a equipe deve escolher o melhor modo de trabalhar. Para auxiliar na melhoria de desempenho dos projetos, seguindo os princípios do DA, podem ser utilizados o sistema de reuniões (Scrum) e organização (Kanban), em conjunto com o pensar em pares e compartilhar (“Think-pair-share”), levantamento de ideias (“Brainstorming”), tela de planejamento (“Team Canvas basic” – Métrico), identificação dos pontos fortes e fracos, oportunidades e ameaças (SWOT), organização com a lista de verificação (“Checklist”) e ações de melhoria contínua (“Kaizen”).
Em projetos educacionais, estudar os problemas e as soluções para eles, requer atividades que devem ser desenvolvidas a partir de um alvo comum e compartilhado[3], com o intuito de incentivar tratativas para problemas do cotidiano, seja da comunidade escolar ou do entorno. Avaliar o ciclo de vida do projeto dentro da estratégia planejada com organização, execução e monitoramento de atividades, proporciona um gerenciamento do tempo e recursos mais eficiente e eficaz.
Os projetos integradores são fundamentais para a formação de conhecimento ampliado e complementar, de habilidades e de atitudes, pois propiciam vivência prática e multidisciplinar, sendo o alicerce do ensino integrado (base comum e técnica). Em paralelo, a participação em eventos externos, reforça a atividade integrada para o desenvolvimento desta competência. Assim, a Educação 3.0 e o “Disciplined Agile”, apresentam-se como abordagens que podem contribuir muito na condução de projetos integradores em escolas, auxiliando na proposta de desenvolver as habilidades e competências dos estudantes de maneira efetiva.
O objetivo deste estudo foi descrever a aplicação do conceito de Educação 3.0 e do “Disciplined Agile” em projetos integradores sustentáveis de Escola Técnica Estadual (ETE)e em uma feira de ciências nacional. Especificamente, pode-se destacar: i. Analisar a interatividade entre os participantes por meio de atividades aos pares, “think-pair-share”, dos projetos integradores e em evento externo; ii. Avaliar o uso da prática da tecnologia na educação 3.0 e do Disciplined Agile nos encontros semanais e virtuais; iii. Monitorar a dinâmica dos projetos integradores e das edições do evento sobre a participação e aperfeiçoamento dos integrantes, inclusive sobre a sustentabilidade em projetos educacionais; iv. Consolidar as informações para a obtenção do desempenho sobre a utilização das metodologias ativas na ETE em análise; v. Propor ações de melhoria contínua para futuros projetos integradores e eventos educacionais.
Este estudo de caso envolveu dois projetos integradores de uma ETE de Pernambuco com ensino integral e profissional, selecionados na categoria de Desenvolvimento Tecnológico (DT) para um evento, que se configura uma das maiores Feiras de Ciências do Brasil. Neste estudo, foi analisado a utilização dessas abordagens em dois projetos integradores: a. O projeto HL, focado na reestruturação sustentável de uma horta escolar com disseminação de conhecimento para a comunidade escolar sobre a importância do plantio de mudas frutíferas e ornamentação com cactáceas. Buscou ainda, trazer novas possibilidades com materiais de reaproveitamento para a montagem de hortas orgânicas; b. o projeto GS que visou a integração dos estudantes com a educação ambiental, por meio de recursos tecnológicos para conscientizar os estudantes do ensino fundamental II e do ensino médio de Pernambuco. No sentido da proteção do meio ambiente com a aplicação da ciência, tecnologia e inovação, bem como promover a educação de qualidade, um dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável – ODS-04, da Organização das Nações Unidas[4].
Em 2020, o projeto integrador submetido foi o PROJETO HL e participante da Feira de Ciências. Esta linha de pesquisa foi composta por sete estudantes do ensino integrado. Para a Feira de Ciências, o líder da equipe escolheu um integrante para o desenvolvimento em par das atividades para o evento. Em 2021, houve a aplicação do mesmo procedimento quantitativo do ano anterior para a elaboração do projeto integrador, isto é, sete novos integrantes; e, mais uma vez, o líder escolheu um integrante da equipe para formação do par do PROJETO GS submetido para o evento.
A proposição para melhorar o processo didático-pedagógico do projeto esteve fundamentada na integração dos estudantes com o DA e a educação 3.0, que consistiu basicamente em: envolver as práticas de metodologias ativas e WoW; acompanhar a participação dos estudantes; e, consolidar as informações. Para o planejamento, execução e controle dos projetos, foram utilizadas as abordagens apresentadas na Figura 1, oferecendo um conjunto de ferramentas (“tool kit”) aos estudantes, possibilitando a organização das etapas de conhecimento adquirido e a prática do autogerenciamento das ações, bem como auxiliando no próprio gerenciamento global do projeto. Este desenvolvimento de atividades tem base em procedimentos virtuais e tecnológicos.
Buscou-se, assim, adotar o ciclo de melhoria contínua (Kaizen) proposto pelo DA, que consistiu em aprimorar e aperfeiçoar o WoW, ou seja, adotar uma mudança, se funcionar; ou descartar, se não atender a expectativa. Neste contexto do Kaizen constam os modelos das ferramentas utilizadas para gerenciar projeto: Trello/Kanban, SWOT, Checklist e do Team Canvas Basic – Métrico. A melhoria contínua é o ato de aplicar uma série de “loops” para melhorar o WoW ao longo do tempo, norteando a orientação para ajudar as equipes a identificar técnicas, que provavelmente funcionarão num determinado contexto. Isso aumenta significativamente a porcentagem de experimentos bem-sucedidos e, portanto, aumenta a taxa geral de melhoria do processo de aprendizagem[5].

Figura 1. Abordagens utilizadas nos projetos integradores e nas edições da feira de ciências nos anos-base: (a) 2020 e (b) 2021 de eventos
Fonte: Elaborado pelo autor.
A pesquisa exploratória foi fundamentada na aplicação de questionários para a coleta de dados da avaliação qualitativa sobre a aplicação de metodologias ativas na ETE em estudo. Para tanto, foram definidos como participantes desta pesquisa os profissionais da unidade escolar técnica estadual, que atuaram em projetos integradores, de vida, de eventos científicos externos e/ou projetos de gestão educacional; bem como, os estudantes do ensino médio-técnico participantes dos projetos integradores HL (2020) e GS (2021) e da feira de ciências nacional, simultaneamente.
Para alcançar os públicos-alvo, foram elaborados dois formulários de pesquisa acadêmica, disponibilizados de 04 fev. 2022 a 13 fev. 2022. O primeiro aplicado para os profissionais da ETE e consistiu em 16 questões, sendo 15 questões fechadas e uma aberta, abrangendo os dados gerais do respondente, autoavaliação, avaliação da metodologia ativa e avaliação da instituição. Já o segundo foi focado nos estudantes da mesma ETE, na qualidade de participantes dos projetos supracitados e conteve 18 questões, sendo 16 fechadas e duas abertas, com seções de dados gerais do respondente, avaliação do professor facilitador, avaliação da metodologia ativa e autoavaliação. Com os dados obtidos nos questionários, efetuou-se a medição de desempenho parcial e total sobre a utilização das metodologias ativas aplicando a escala (0 a 5) para indicar discordo totalmente, discordo em partes, indiferente, concordo em partes; e, concordo totalmente.
O questionário 1, teve como escopo a coleta de informações relativa à percepção dos profissionais da ETE que atuaram com projetos obteve 20 respostas. A primeira questão abordou a identificação de cargo e função dos respondentes na ETE, e em síntese, a pesquisa identificou como participantes: 75% de professores da base comum e técnica; e 25% equipe de gestão. Revelando, que dos professores participantes, a maior parte foi da atuação na base técnica, representando 55%. Quanto ao tipo de projeto aplicado, 75% dos professores responderam que atuaram com projetos integradores e apenas 10% com projetos científicos para eventos externos.
Da etapa da autoavaliação, sobre o comprometimento para a inserção de novas tecnologias de aprendizagem e do engajamento com as práticas digitais propostas, todos os respondentes concordaram com as proposições. Sobre a habilidade para despertar o interesse por novas práticas de projetos 90% concordaram e 10% responderam indiferente. Da etapa da avaliação da metodologia ativa, sobre a utilização dos métodos ativos para desenvolvimentos de projetos, todos concordaram da aplicação. Dentre as metodologias ativas aplicadas nos projetos, destaca-se o “Google Classroom” institucional e “Google Forms”, ambos alcançando 90% das respostas. Com relação ao tempo de aplicação das metodologias ativas na ETE em estudo, 55% das respostas foi de 1 a 3 anos.
Ainda na etapa, todos os respondentes concordaram que obtiveram resultados positivos por aplicarem a metodologia ativa pela agilidade e engajamento nas ações do projeto. Concernente à efetividade das plataformas virtuais, 75% dos respondentes concordaram, sendo que 90% concordaram que houve o engajamento para fortalecer as metodologias ativas em projetos. Da etapa sobre a avaliação da instituição, 80% dos respondentes afirmaram que os recursos tecnológicos supriram as necessidades, em contrapartida sobre a questão de acesso à banda larga, 80% dos respondentes concordaram com a dificuldade para desenvolver as práticas “on-line” para o desenvolvimento dos projetos.
O desempenho total, dos desempenhos parcial e total do questionário 1 aplicado com os professores e equipe de gestão, apontou para um rendimento total de 81%, especificando a etapa de autoavaliação e de avaliação da metodologia ativa, os índices alcançados foram 92% e 86%, respectivamente. Para a etapa da avaliação da instituição em termos de recursos tecnológicos e conexão à banda larga obteve o desempenho de 55%.
De acordo com as respostas dos professores e equipe de gestão as metodologias ativas mais aplicadas nos projetos foram o “Google Classroom” institucional e “Google Forms”, indicando que poucos professores aplicam as ferramentas específicas de projetos, e por conseguinte, desconhecem as potencialidades para agregar valor para as entregas. Os respondentes afirmaram que obtiveram resultados positivos com a aplicação das metodologias e que pretendem continuar utilizando, sendo que mais da metade dos respondentes utiliza metodologia ativa há menos de 3 anos, coincidindo com o período em que houve a obrigatoriedade de uso de ferramentas digitais em função da situação pandêmica. Concernente à efetividade das plataformas virtuais e engajamento a maioria dos respondentes concordou que foram acolhidos e participaram do processo. Sobre o acesso à banda larga, a maioria dos respondentes concordou com a dificuldade para desenvolver as práticas “on-line” de desenvolvimento dos projetos, pela falta de recursos tecnológicos. Este fato foi minimizado após a realização da pesquisa, já que pelo programa professor conectado houve a distribuição de “notebook” e auxílio para o acesso à “internet” dos professores efetivos com a inclusão dos professores contratados, bem como a equipe de gestão.
O questionário 2, os estudantes participantes dos projetos integradores e evento externo, totalizando quatro respondentes, ou seja, dois estudantes do segundo ano do integrado do Projeto HL e dois estudantes do primeiro ano do integrado, do projeto GS. Sobre a avaliação do professor facilitador, todos os estudantes do projeto HL e do GS concordaram, que o professor foi comprometido com a inserção de novas tecnologias e práticas digitais, proporcionou mecanismos de levantamento de dados e tomadas de decisões em conjunto no decorrer do projeto.
Quanto a avaliação da metodologia ativa, os estudantes do projeto HL e GS, concordaram que a plataforma virtual (Trello/Kanban) foi funcional para a compreensão das fases do projeto, bem como por agregar agilidade e engajamento nas ações. Também concordaram que os encontros virtuais (reuniões “on-line”, tipo Scrum) foram efetivas no desenvolvimento do projeto.
Para os integrantes do projeto HL, concordaram que foi difícil o acesso à banda larga para as práticas on-line de projetos e um deles discordou que os recursos tecnológicos atenderam todas as necessidades. Enquanto para os componentes do projeto GS, não foi significativo, no tocante à dificuldade de acesso à banda larga na ETE e não houve concordância sobre ao suprimento dos recursos tecnológico sem relação a todas as necessidades. De acordo com os cálculos evidenciados, sobre os desempenhos parcial e total do questionário 2, aplicado com os estudantes do médio técnico integrado envolvidos com o projeto integrador e evento externo, foi alcançado desempenho total de 86%, e desdobrando a etapa I da avaliação do professor facilitador, foi alcançado o rendimento de 96%, sobre a etapa III, da autoavaliação do estudante foi de 82%. Para a etapa II, a avaliação da metodologia ativa e recursos tecnológicos e conexão teve um rendimento de 79%.
Sobre a avaliação do professor facilitador, todos os estudantes do projeto HL e do GS concordaram que o professor foi comprometido com a inserção de novas tecnologias e avaliaram positivamente os resultados do uso das metodologias ativas, reforçando o posicionamento de engajamento dos professores no processo. Os estudantes do projeto HL e GS, concordaram que as plataformas virtuais (Trello/Kanban) foram funcionais para a compreensão das fases do projeto, bem como por agregar agilidade e organização e ordenação nas ações. Também concordaram que a dinâmica dos encontros virtuais (reuniões on-line, tipo Scrum) foi efetiva no desenvolvimento do projeto.
Para os integrantes do projeto HL de 2020, os participantes concordaram que foi difícil o acesso à banda larga para as práticas “on-line” de projetos e um deles discordou que os recursos tecnológicos atenderam todas as necessidades. Já para os componentes do projeto GS de 2021, metade concordou em parte e a outra metade foi indiferente. No tocante à dificuldade de acesso à banda larga na ETE, a metade dos respondentes discordou que os recursos tecnológicos supriram todas as necessidades, apresentando uma tendência de melhora, quanto à necessidade por recursos digitais, mas mostrando que esse ainda é um fator limitante.
Assim, com a consolidação dos conhecimentos por meio das ferramentas de metodologias ativas, espera-se que os estudantes aumentem o engajamento na pesquisa, inclusive pela aplicação das novas tecnologias de assimilação prática dos conhecimentos teóricos, ora estudados no ensino integrado da ETE. As ferramentas da educação 3.0 e DA irão proporcionar um maior dinamismo e impulso tecnológico para perguntar e aprender, protagonismo do estudante no centro da aprendizagem, contextualização de saberes, aprimoramento de habilidades para solução de problemas, bem como o desenvolvimento de competências como os aspectos lógico, criativo e pensamento analítico de projetos. Vale salientar, que os resultados da pesquisa apontaram para uma baixa utilização de importantes ferramentas de metodologias ativas, como o “Design Thinking”, Gamificação, “Project Based Learning”, indicando oportunidades para a melhoria desse processo por meio de mais capacitações em metodologias ativas para os professores, fóruns de discussão e compartilhamentos de experiências, inclusive ainda como proposição, as abordagens entre instituições.
Referências
[1] Sassaki C. Educação 3.0: Uma proposta pedagógica para a educação. 2019. Disponível em: <https://orientaeducacao.files.wordpress.com/2019/02/educac3a7c3a3o-3.0-uma-proposta-pedagc3b3gica.pdf>.
[2] Cavalcante A.N.; Lira G.V.; Cavalcante Neto P.G.; Lira R.C.M. 2018. Análise da produção bibliográfica sobre problem-based learning (PBL) em quatro periódicos selecionados. Revista Brasileira Educação Médica. 2018; 42(1).
[3] Walker A.; Leary H.; Hmelo-Silver C. E.; Ertmer P. A. Essential Readings in Problem-Based Learning. West Lafayette (IN): Purdue University Press. 2015.
[4] Organização das nações unidas. Objetivo de Desenvolvimento Sustentável: 4 – Educação de qualidade. 2021. Disponível em: <https://brasil.un.org/pt-br/sdgs/4>. [5] PMI. Foundation for Business Agility: Disciplined Agile. 2021. Disponível em: <www.pmi.org/disciplined-agile>.
Como citar
Melo Neto R.P.; Perides M.P.N. Implementação do discipline agile e educação 3.0 em projetos educacionais sustentáveis. Revista E&S. 2023; 4: e20230008.
Sobre os autores
Rútilo Pinheiro de Melo Neto, Professor na Secretaria de Educação do Estado de Pernambuco, Especialista em Gestão de Projetos, Recife, PE, Brasil
Maria Paula Novakoski Perides, Doutora em Administração, Gerente de Projetos Senior, São Paulo, SP, Brasil.
Link para download: https://revistaes.com.br/wp-content/uploads/2023/04/23008.pdf