Planejamento tributário de empresa de prestação de serviços para construção civil no município de Curitiba
21 de julho de 2022
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DOI: 10.22167/2675-6528-20220025
E&S 2022,3: e20220025
Dayane Campos Souza e Raissa Alvares de Matos Miranda
O planejamento tributário, também denominado elisão fiscal, determina, antecipadamente, quais são os objetivos da companhia e como alcançá-los, seja por meio da redução, diferimento ou, até mesmo, da exoneração de tributos[1]. Portanto, planejamento tributário deve ser entendido como uma forma lícita de reduzir a carga fiscal[2], e como um instrumento eficaz de estratégia empresarial[3].
Diante disso, com base nas informações contábeis de uma empresa constituída no segundo semestre de 2020, a finalidade de desenvolver uma atividade de intermediação e agenciamento de serviços e negócios, em geral, definiu o regime de tributação que permitiria maior economia dos tributos federais (Imposto de Renda da Pessoa Jurídica [IRPJ], Contribuição Social sobre o Lucro Líquido [CSLL], PIS e COFINS) e o tributo municipal incidente sobre a prestação de serviço (ISS), nos regimes de Simples Nacional e Lucro Presumido.
O regime do lucro real não foi analisado neste trabalho em razão da recente criação da empresa, fato que impacta diretamente nos recursos disponíveis para apuração neste regime, que além de ter custo elevado, é de alta complexidade[4].
Conforme disposto no art. 258 do RIR/18[5], o lucro real deve ser apurado com base no lucro apresentado pela contabilidade, o que, ao contrário do Lucro Presumido e Simples Nacional, demanda intenso rigor com as escriturações contábeis.
Além disso, considerando que a empresa não pretende aderir benefícios fiscais e não tem como insumo principal bens que possibilitem a utilização de créditos de PIS/COFINS, as vantagens da sistemática do lucro real não seriam usufruídas pela empresa, que contaria apenas com maior complexidade na apuração tributária e maiores gastos com a contabilidade.
A análise dos regimes tributários foi realizada com base nas receitas e despesas que incorrem na atual realidade da empresa e em contratos futuros. Assim, considerou-se como receita bruta anual R$ 900.000,00, representando R$ 75.000,00 mensal. Atualmente, a empresa se encontra no regime de tributação do Simples Nacional recolhendo tributos com base no Anexo III1 da Lei Complementar nº 123/06[6], em razão da atividade desenvolvida, submetendo-se a alíquotas que variam de 6% a 33%, conforme demonstrado na Tabela 1, indicando que o valor de impostos pagos no período de 12 meses (ano civil) no Simples Nacional é de R$ 108.360,00:
Tabela 1. Cálculo do Tributo pelo Simples Nacional Anexo III
Receita Bruta Mensal Aproximada | R$75.000,00 |
Receita Bruta Acumulada nos últimos 12 meses (aproximada) | R$900.000,00 |
Alíquota (faixa 4) | 16% |
Parcela a Deduzir (faixa 4) | R$35.640,00 |
Valor com aplicação da Alíquota (16%) | R$900.000,00×16%=R$144.000,00 |
Valor deduzido da parcela a deduzir | R$144.000,00-R$35.640,00=R$108.360,00 |
Alíquota efetiva | R$108.360,00÷R$900.000,00≅12,04% |
Valor do Simples Nacional Mensal | R$75.000×12,04%=R$9.030,00 |
Valor anual aproximado do Simples Nacional | R$9.030,00×12=R$108.360,00 |
Fonte: Elaborado pelo autor
Os mesmos parâmetros foram utilizados na determinação do imposto no regime do lucro presumido, como mostra a Tabela 2. Em virtude da atividade desempenhada pela empresa ora estudada – intermediação –, a base de cálculo tanto do IR como do CSLL representa 32% dessa receita (percentual de presunção).
Tabela 2. Cálculo dos Tributos pelo Lucro Presumido
Faturamento Mensal | R$75.000,00 |
Faturamento Trimestral | R$225.000,00 |
Base de Cálculo Presumida (32%) | R$72.000,00 |
Valor com aplicação da alíquota de Imposto de Renda (15%) sobre o faturamento trimestral | R$10.800,00 |
Valor com aplicação do adicional para receita superior a R$ 60.000,00 no trimestre (10%) | R$1.200,00 |
Total Imposto de Renda | R$12.000,00 |
Valor com aplicação da alíquota de CSLL (9%) sobre o faturamento trimestral | R$6.480,00 |
Total IR e CSLL trimestral | R$18.480,00 |
Total IR e CSLL anual | R$73.920,00 |
Valor com aplicação da alíquota do PIS (0,65%) sobre o faturamento mensal | R$487,50 |
Valor com aplicação da alíquota do COFINS (3%) sobre o faturamento mensal | R$2.250,00 |
Total PIS/COFINS mensal | R$2.737,50 |
Total PIS/COFINS anual | R$32.850,00 |
Valor com aplicação da alíquota do ISS (2,5%) sobre o faturamento mensal | R$1.875,00 |
Total ISS anual | R$22.500,00 |
Total de tributos devidos anualmente | R$129.270,00 |
Fonte: Elaborado pelo autor
Portanto, diante de tais análises e considerando o atual cenário da empresa, identificou-se que o regime do Simples Nacional é o que melhor proporciona economia tributária, pois corresponde a economia de 16,17% de tributos em relação ao Lucro Presumido, o equivalente a R$ 20.910,00 e que poderão ser alocados para outras finalidades.
Dessa forma, o instituto da elisão fiscal visa, por meios lícitos, diminuir a base de cálculo imponível ou evitar a ocorrência do fato gerador, coibindo o surgimento da obrigação tributária ou reduzindo o valor a ser pago[7]. Para que tal planejamento seja eficaz, é essencial que esteja alinhado ao planejamento estratégico, o qual consiste em uma técnica administrativa, cujos elementos externos e internos da empresa são analisados com o objetivo de definir as oportunidades, ameaças, pontos fortes e fracos da corporação[8].
Assim, é nítido que o planejamento tributário deve ser adotado sob o viés da multidisciplinariedade, envolvendo principalmente conhecimentos em direito, contabilidade e administração. Isso porque, o planejamento tributário pode ser operacional, tratando dos procedimentos formais previstos em normas ou costumes, ou estratégico, o qual afeta, por exemplo, a estrutura do capital da empresa, localização, regime tributário e organização societária[9].
Uma boa gestão estratégica de tributos conta com o diagnóstico, vertentes e as frentes de ação, essa última é dada pela definição do melhor regime tributário para a atividade econômica, no caso, Simples Nacional.
A primeira fase do diagnóstico consiste em uma análise do cenário da empresa, considerando elementos tributários e societários, visando uma prospecção futura. Assim, com base nesse instituto, contatou-se que a empresa estudada possui natureza limitada e está localizada no Município de Curitiba, ela possui distribuição de lucros fixo mensal e está enquadrada no regime do Simples Nacional, operando a atividade de prestação de serviço de intermediação, incidindo ISS.
A segunda e terceira etapa do diagnóstico[7] englobou o desenvolvimento de alternativas tributárias e societárias, bem como a implementação das hipóteses identificadas. No caso, a análise se limitou a definir o regime tributário, concluindo que o regime do Simples Nacional é o que proporciona maior economia tributária.
Por fim, as vertentes mapeiam os riscos e a probabilidade de os eventos acontecerem em relação à cada possibilidade de planejamento tributário construída, a fim de evitar ônus à pessoa jurídica e aos empresários. Por isso, buscou-se definir o Ponto de Equilíbrio entre o regime do Simples Nacional e o Lucro Presumido, com o intuito de identificar quando deve haver a mudança do regime tributário, mantendo as condições atuais e visando preservar a opção pela sistemática que promova maior economia tributária ao mesmo tempo que atenda aos objetivos empresariais.
Desse modo, através do método iterativo, foi definido o faturamento mensal de R$ 213.350,11 valor cuja tributação pelos regimes do Simples Nacional e Lucro Presumido são idênticos, ou seja, que o faturamento da empresa, que antes era de R$ 75.000,00, superará o valor de equivalência entre os regimes de tributação retromencionados, implicando na adoção do regime do Lucro Presumido, pois será a opção que propiciará maior economia tributária, conforme mostram as Tabelas 3 e 4.
Tabela 3. Projeção Otimista: Cálculo do Tributo pelo Simples Nacional Anexo III
Receita Bruta Mensal Aproximada | R$213.350,11 |
Receita Bruta Acumulada nos últimos 12 meses (aproximada) | R$2.560.201,32 |
Alíquota (faixa 5) | 21% |
Parcela a Deduzir (faixa 5) | R$125.640,00 |
Valor com aplicação da Alíquota (21%) | R$2.560.201,32×21%=R$537.642,28 |
Valor deduzido da parcela a deduzir | R$537.642,28-R$125.640,00=R$412.002,28 |
Alíquota efetiva | R$412.002,28÷R$2.560.201,32≅16,09% |
Valor do Simples Nacional Mensal | R$213.350,11×16,09%=R$34.333,52 |
Valor anual aproximado do Simples Nacional | R$34.333,52×12=R$412.002,28 |
Fonte: Elaborado pelo autor
Tabela 4. Projeção Otimista: Cálculo dos Tributos pelo Lucro Presumido
Faturamento Mensal | R$213.350,11 |
Faturamento Trimestral | R$640.050,33 |
Base de Cálculo Presumida (32%) | R$204.816,11 |
Valor com aplicação da alíquota de Imposto de Renda (15%) sobre o faturamento trimestral | R$30.722,42 |
Valor com aplicação do adicional para receita superior a R$ 60.000,00 no trimestre (10%) | R$14.481,61 |
Total Imposto de Renda | R$45.204,03 |
Valor com aplicação da alíquota de CSLL (9%) sobre o faturamento trimestral | R$18.433,45 |
Total IR e CSLL trimestral | R$63.637,48 |
Total IR e CSLL anual | R$254.549,90 |
Valor com aplicação da alíquota do PIS (0,65%) sobre o faturamento mensal | R$1.386,78 |
Valor com aplicação da alíquota do COFINS (3%) sobre o faturamento mensal | R$6.400,50 |
Total PIS/COFINS mensal | R$7.787,28 |
Total PIS/COFINS anual | R$93.447,35 |
Valor com aplicação da alíquota do ISS (2,5%) sobre o faturamento mensal | R$5.333,75 |
Total ISS anual | R$64.005,03 |
Total de tributos devidos anualmente | R$412.002,28 |
Fonte: Elaborado pelo autor
Ainda que ocorra eventos imprevisíveis, como a pandemia do coronavírus, é indubitável conhecer previamente possíveis futuros que favorecem competitivamente a empresa, promovendo a preparação de estratégias, gestão de riscos e organização para lidar com as incertezas ocasionadas pelas mudanças[10].
Portanto, considerando o atual panorama econômico-financeiro da empresa analisada, o Simples Nacional é o regime que implica na maior economia tributária. Isso porque, além das alíquotas menores, a entidade não faz jus ao regime de creditamento. Vale ressaltar que na aquisição do principal bem objeto de intermediação pela empresa incide uma alíquota de 12% de ICMS, sobre a qual a empresa não pode se creditar, por não ser contribuinte deste tributo.
No mesmo sentido, a empresa não credita valores decorrentes do PIS/COFINS, de modo que não há redução no pagamento dessas contribuições ou compensações, mas são elementos que impactam fortemente na constituição da carga tributária empresarial.
Além disso, apesar de ter-se vislumbrado que o regime do Simples Nacional é o que melhor atende às premissas do planejamento tributário para essa corporação, proporcionando, portanto, maior economia tributária e alinhamento com os objetivos empresariais atuais, é essencial que tais análises sejam periodicamente revistas, pois são resultados que estão diretamente relacionados ao desempenho da empresa, ao ramo de atuação e às alterações legislativas.
1O Anexo III informado refere-se a alíquotas e partilha do Simples Nacional – Receitas de locação de bens móveis e de prestação de serviços não relacionados no § 5º-C do art. 18 desta Lei Complementar.
Referências
[1] Chiavenato I. Administração nos novos tempos. 2ed. 2004. Elsevier, Rio de Janeiro, RJ, Brasil.
[2] Oliveira L.M.; Chieregato R.; Perez Junior J.H.; Gomes M.B. Manual de contabilidade tributária: textos e testes com as respostas. 8ed. 2009. Atlas, São Paulo, SP, Brasil.
[3] Ferreira A.H.S.; Duarte A.M.P. Planejamento tributário: instrumento eficaz de gestão empresarial. Qualit@s 2005; 4(2). Disponível em: <http://revista.uepb.edu.br/index.php/qualitas/article/viewFile/52/ 43>.
[4] Reis R.T. O Custo das obrigações Acessórias nas Empresas do Lucro Real da Grande São Paulo. Revista Pensamento & Realidade. 2015; 30(3). Disponível em: <https://revistas.pucsp.br/index.php/pensamentorealidade/article/view/20300/18741>.
[5] Brasil. Decreto nº 9.580, de 22 de novembro de 2018. Regulamenta a tributação, a fiscalização, a arrecadação e a administração do Imposto sobre a Renda e Proventos de Qualquer Natureza. 2018. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2018/decreto/D9580.htm>.
[6] Brasil. Lei complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006. Institui o Estatuto Nacional da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte. 2006. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br /ccivil_03/leis/lcp/lcp123.htm>.
[7] Oliveira Neto A.M.; Castro F.A.V.; Sousa Filho R.C.; Souza Junior A.A.L. Gestão e Planejamento de Tributos. 2ed. 2011. Editora FGV, São Paulo, SP, Brasil.
[8] Fischmann A.; Almeida M.I.R. Planejamento estratégico na prática. 1995. Atlas, São Paulo, SP, Brasil.
[9] Borges H.B. Gerência de impostos: IPI, ICMS e ISS. 3ed. 2000. Atlas, São Paulo, SP, Brasil.
[10] Silva A.T.B.; Spers R.G.; Wright J.T.C. A elaboração de cenários na gestão estratégica das organizações: um estudo bibliográfico. RCA, 2012; 12(32): 21-34. <https://doi.org/10.5007/2175-8077.2012v14n32p21>.
Como citar
Souza D.C.; Miranda R.A.M. Planejamento tributário de empresa de prestação de serviços para construção civil no município de Curitiba. Revista E&S. 2022; 3: e20220025.
Sobre os autores
Dayane Campos Souza, Advogada tributarista e Especialista em Gestão Tributária, Curitiba, PR, Brasil.
Raissa Alvares De Matos Miranda, Doutora em Ciências (Administração), Ribeirão Preto, SP, Brasil.
Editorado por: Edson Pereira da Mota
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